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Revista oficial da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia ASBAI
Revista oficial da Sociedad Latinoamericana de Alergia, Asma e Inmunología SLaai

Número Atual:  Janeiro-Fevereiro 2014 - Volume 2  - Número 1


Editorial

Medida da fração de óxido nítrico exalado na asma

Measurement of fraction of exhaled nitric oxide in asthma

Nelson Rosário Filho


MD, PhD. Departamento de Pediatria, Universidade Federal do Paraná, UFPR


Endereço para correspondência:

Nelson Rosário Filho
E-mail: nelson.rosario@onda.com.br




O óxido nítrico está presente em todos os tecidos humanos, está presente no ar exalado e tem participação na biologia pulmonar e na fisiopatologia das doenças respiratórias, incluindo asma1,2. Níveis elevados da fração de óxido nítrico exalado (FeNO) podem ser biomarcadores de eosinofilia nas vias aéreas e úteis para o tratamento da asma3,4.

Citocinas e mediadores pró-inflamatórios regulam o óxido nítrico nas vias aéreas periféricas e centrais. É possível estimar qual local predominante contribui para o aumento de FeNO, bem como o potencial fisiopatológico em diversas doenças respiratórias. Em asma o aumento na FeNO reflete razoavelmente bem as vias inflamatórias dependentes do eosinófilo, e isto implica em conhecer a resposta ao tratamento com corticosteroides. Em geral a medida de FeNO ao fluxo expiratório de 50 mL/s pode ser útil para o diagnóstico e tratamento de casos selecionados de asma. É complementar às recomendações de diretrizes internacionais de asma, por ser um método não invasivo para a avaliação de inflamação eosinofílica predominantemente de vias aéreas centrais. Em algoritmo de pesquisas clínicas randomizadas em asma, os benefícios de se adicionar a medida de FeNO às diretrizes internacionais comuns incluindo espirometria, mostrou benefício duvidoso5.

Observação interessante que precisa ser confirmada, indica que disfunção olfatória representativa de sinusite eosinofílica ou polipose nasal está associada a níveis mais elevados de FeNO em asmáticos6.

Em crianças, a medida de FeNO pode ser utilizada para a introdução da corticoterapia inalatória, titulação da dose empregada e para a interrupção deste tratamento7,8. Níveis elevados indicam resposta a corticoterapia inalatória, e melhora dos parâmetros espirométricos e hiperresponsividade brônquica9. Entretanto, não há evidências que, no dia a dia, a determinação da FeNo contribua para auxiliar o clínico no tratamento da asma10-12.

Um grupo reconhecido de experts recomenda a determinação da FeNO para monitorar inflamação das vias aéreas, mas admite que a evidência é de baixa qualidade. Esta diretriz de prática clínica, documento oficial da American Thoracic Society, faz algumas recomendações:

a - o uso da FeNO no diagnóstico de inflamação eosinofílica das vias aéreas;
b - para determinar a probabilidade de resposta a corticosteroides;
c - no diagnóstico de asma como evidência objetiva;
d - uso de pontos de corte em vez de valores de referência;
e - considerar a idade < 12 anos capaz de afetar os valores da FeNO;
f - valores < 25 ppb (20 ppb em crianças) indicam que inflamação eosinofílica e resposta a corticoterapia são improváveis;
g - valores > 50 ppb (35 ppb em crianças) indicam resposta a corticosteroides;
h - valores entre 25 e 50 devem ser valorizados com cuidado;
i - FeNO pode auxiliar na monitoração de inflamação das vias aéreas;
j - reduções de pelo menos 20% para valores > 50 ppb ou mais que 10 ppb para valores < 50 ppb como ponto de corte, indicam resposta significativa à terapêutica anti-inflamatória13.

Estudo longitudinal de medidas repetidas de FeNO durante 10 meses em crianças com e sem asma, mostrou que os valores basais e o intervalo entre as medidas são relevantes, podem aumentar 100% em 2 a 4 meses, e independentes da presença de asma. Outra observação foi que em pacientes com sintomas de asma e baixos níveis de FeNO deve alertar para a possibilidade de outro diagnóstico à asma. As alterações em 851 determinações de FeNO estavam associadas positivamente à concentração inicial de FeNO e o intervalo entre as medidas14.

No artigo de Carvalho et al.15 a casuística é pequena, e os participantes foram selecionados por responderem ao questionário ISAAC, e não foi avaliada contagem de eosinófilos. Algumas limitações não foram abordadas, por exemplo, se eram atópicos ou se tinham rinite, que podem interferir nos valores de FeNO. Entretanto, o ponto forte do trabalho foi apresentar FeNO como recurso para validar as questões sobre asma do ISAAC.

A medida de FeNO pode ter aplicações práticas em pacientes selecionados por ser precisa, reprodutível, e fornecer resultados imediatos5. Se o controle da asma é a estratégia clínica para ajuste de tratamento, não deveria também ser usado como medida de desfecho, e outra medida, como exacerbações da asma, questionários de qualidade de vida, ou outro desfecho, deveriam ser usados para avaliar a eficácia do tratamento5.

Fatores como a idade (crianças, 12 anos), altura, gênero, atopia e tabagismo têm que ser considerados na determinação de valores normais. Jovens, mais altos, atópicos, sexo masculino e não fumantes têm valores mais altos de NO exalado5,16,17.

Alguns autores propõem que estabelecer o melhor valor de FeNO para cada paciente deva ser a referência para futuras determinações, a exemplo do que se faz com a medida do pico de fluxo expiratório (PEFR)18.

Dados de 12.408 participantes do National Health and Nutrition Examination Survey 2010 para investigar a relação entre FeNO, contagens de eosinófilos e sintomas de asma, diagnóstico e eventos agudos nos últimos 12 meses, avaliados por questionário, mostraram a associação entre estes biomarcadores e o risco de sintomas e crises agudas de asma, independente do tratamento19. Embora possam minimizar o risco futuro de asma não significam que controle de sintomas representa controle da inflamação20.

Os valores de FeNO refletem repostas das vias aéreas mediadas por IL-4 e IL-13. Aumento da FeNO é um excelente marcador de resposta clínica a lebrikizumabe (anti IL-13), dupilumabe (anti subunidade alfa do receptor de IL-4) e omalizumabe (anti-IgE), mas não a mepolizumabe (anti IL-5)21-24.

Payne e Bush mostraram variação do fenótipo de asma grave em crianças com base nas medidas de FeNO e a resposta a corticosteroides. Um fenótipo de resistência a este grupo de fármacos com sintomas persistentes tinha níveis elevados de FeNO, e, outro, com sintomas persistentes, tinha níveis baixos de FeNO25.

Outro fator de confusão é a observação de Fleming et al. que 41% das crianças com asma preencheram os critérios de asma eosinofílica em uma ocasião e asma não eosinofílica em outra, sem modificações concomitantes no tratamento de NO exalado. Este dado questiona a estabilidade do fenótipo da asma moderada/grave na criança, e sugere medidas seriadas do FeNO26.

Com todas as recomendações das diretrizes internacionais, e o conhecimento dos fatores que interferem com os valores de FeNO, fica claro que as medidas devem ser obtidas repetidas vezes nos pacientes com asma, e que são úteis como biomarcadores para resposta terapêutica à corticoterapia inalatória e agentes biológicos27.

 

REFERÊNCIAS

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3. Taylor DR, Pijnenburg MW, Smith AD, De Jongste JC. Exhaled nitric oxide measurements: clinical application and interpretation. Thorax. 2006;61:817-27.

4. Smith AD, Cowan JO, Brassett KP, Herbison GP, Taylor DR. Use of exhaled nitric oxide measurements to guide treatment in chronic asthma. N Engl J Med. 2005;352:2163-73.

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7. Pijnenburg MW, Hofhuis W, Hop WC, de Jongste JC. Exhaled nitric oxide predicts asthma relapse in children with clinical asthma remission. Thorax. 2005;60:215-8.

8. Zacharasiewicz A, Wilson N, Lex C, et al. Clinical use of noninvasive measurements of airway inflammation in steroid reduction in children. Am J Respir Crit Care Med. 2005;171:1077-82.

9. Smith AD, Cowan JO, Brassett KP, et al. Exhaled nitricoxide: a predictor of steroid response. Am J Respir Crit Care Med. 2005;172:453-9.

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11. Fritsch M, Uxa S, Horak F Jr, et al. Exhaled nitric oxide in the management of childhood asthma: a prospective 6-months study. Pediatr Pulmonol. 2006;41:855-62.

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13. Dweik RA, Boggs PB, Erzurum SC, Irvin CG, Leigh MW, Lundberg JO, et al. An official ATS clinical practice guideline: interpretation of exhaled nitric oxide levels (FENO) for clinical applications. Am J Respir Crit Care Med. 2011;184:602-15.

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